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Escrito por MARIA JOSÉ MAGALHÃES DA SILVA
& MARIA LUÍSA MALATO
Sobre os textos gentilmente cedidos à CNB pelos oradores da conferência/conversa realizada no Teatro Camões a 25 de janeiro de 2014, que reproduzem as suas intervenções [Sousa, C. M., Eiras, P. e Santos, J. P. (2014). Sophia e a dança. Lisboa: Companhia Nacional de Bailado].

Escrito por HUGO MONTEIRO
Pulsa, no poema escutado desde a infância – antes mesmo de se saber da existência da literatura –, o protesto sonoro e sem língua que é a própria infância.
I. Antes do início
Na sua precisão luminosa, Sophia declara, ao longo da sua escrita, uma fidelidade ao indício de uma origem silenciada nas coisas e nos seres, de que o poema é rastro e rumor. Trata-se de uma fidelidade ao que, desde o início, desde sempre, se imprimiu numa concepção de poesia e de poema intuída no exterior de qualquer disciplina discursiva. Somos confrontados com uma abordagem da poesia ligada ao modo do seu acontecer, da sua experiência concreta e, de certa forma, selvagem:

Escrito por PAULO BORGES
O poema vive da tensão entre as modalidades temporais do já, do ainda não e do “um dia”, sendo que o que faz com que as duas últimas se experimentem e toda a composição não colapse e se desfaça no eterno e instante presente do já, são as “pontes” que prendem o ser profundo, pleno e autêntico “à agitação do mundo do irreal”.
Há na poesia de Sophia de Mello Breyner Andresen um impulso para a plenitude que marca desde o início a sua obra, claramente expresso no poema “Pudesse eu não ter laços nem limites”:

Escrito por LIRANDINA GOMES
A linguagem lírica e as imagens poéticas de Sophia de Mello são marcadas por conteúdos geográficos como paisagem, lugar, cidades que têm um sentido do vivido, que representam ressonâncias imaginativas e afetivas da sua existência.
O interesse recíproco dos geógrafos humanistas/culturalistas pela literatura, poesia e outras artes e, dos filósofos, poetas e escritores pelo espaço e suas categorias analíticas como paisagem, região e lugar vai originar o que o geógrafo, escritor e poeta Kenneth White denominou “Geopoética”, em 1989. No mesmo ano em que criou o Instituto Internacional de Geopoética, K. White declarava:

Escrito por ANNABELA RITA
…quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Sophia de Mello Breyner Andresen é uma voz absolutamente singular da literatura portuguesa, sacerdotisa do verbo poético que embebe de memória estética, dotando-o de uma museologia imaginária que convoca, quer a sua obra, quer a ocidentalidade mais universalizante da nossa cultura, reflectindo-se nelas em fragmentos autorretratísticos. Jogo de reflexos em jeito de palimpsesto. Vibrante de refrações, de fantasmas, de convocações.

Escrito por FERNANDA BERNARDO
escrevo:
nesta manhã eu recomeço o mundo
Sophia de Mello Breyner, «Igrina»
E os poemas serão o próprio ar
‒ canto do ser inteiro e reunido
Sophia de Mello Breyner, «Igrina»
“Se um poeta diz ‘obscuro’, ‘amplo’, ‘barco’, ‘pedra’ é porque estas palavras nomeiam a sua visão do mundo, a sua ligação com as coisas. Não foram palavras escolhidas esteticamente pela sua beleza, foram escolhidas […] pelo seu poder poético de estabelecer uma aliança”, escreveu Sophia de Mello Breyner Andresen (*Porto, 1919 – †Lisboa, 2004) na sua “Arte Poética II”1, talvez um dos seus textos mais exuberantemente programáticos para o perscrutar da singularidade da sua assinatura po-ética: é a silhueta desta que, muito de passagem, aqui se desejaria vislumbrar.

Sophia e Poesia: «..caminho no passeio, rente ao muro mas não caibo na sombra»
29 Outubro 2019
Escrito por MARIA CELESTE NATÁRIO
A obra de arte faz parte do real
e é destino, realização, salvação e vida
Sophia de Mello Breyner
O poema autêntico é a
invocação de um mistério
Eudoro de Sousa
Será o ser que permite que a poesia nasça,
para nela se encontrar e, assim,
nela se fechando, abrir-se como mistério
Martin Heidegger
É num plano ontológico que temos lido a obra de Sophia de Mello Breyner Andresen por nela nos parecer estar presente, de modo patente ou latente, não só a procura da verdade das coisas, mas algo mais ainda: a revelação da falsidade das coisas. Com efeito, a sua poesia é, ou apresenta-se ao nosso olhar, como um caminho de desocultação, simultaneamente no sentido de uma verdade, como da sua essência, numa acepção próxima da ideia de desocultação do ente de sinal heideggeriano, particularmente evidente nas suas concepções de arte – entendendo-se esta como o “pôr-se em obra da verdade” e sendo “a beleza um modo como a verdade enquanto desocultação advém”.1

Com Sophia de Mello Breyner nas palavras que invocam o silêncio sagrado da Vida
29 Outubro 2019
Escrito por SAMUEL DIMAS
A sensibilidade do poeta que se alegra com o esplendor do mundo de forma apaixonada é a mesma com que se revolta perante o sofrimento e a injustiça, numa coerência íntima e fiel de louvor e protesto que é expressão do desejo de rigor e verdade, intrínseco à estrutura do poema.

Escrito por JOSÉ RUI TEIXEIRA
Peço-te que venhas e me dês
Um pouco de ti mesmo onde eu habite1
Sophia de Mello Breyner Andresen
Sophia chegou cedo. Tinha onze ou doze anos quando li «O Cavaleiro da Dinamarca», cuja primeira edição data de 1964. É difícil explicar o que nos ensina cada livro que lemos. Se fechar os olhos, passados mais de 30 anos, recordo que ali aprendi a condição de peregrino, uma qualquer deriva que não só nos conduz de Jerusalém a Veneza, como – mais profundamente – nos possibilita uma iniciação ao testemunho mudo das pedras de uma e às águas trémulas dos canais da outra, onde se refletem as leves colunas dos palácios cor-de-rosa. Aí aprendi que um cabelo preto pode ser azulado como a asa de um corvo e que «ninguém deve impedir um peregrino de partir».2