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Alexandre Costa

 

 

Os romances que escrevi foram, de alguma maneira, espelhos de outra coisa que passava por eles.

(Vergílio Ferreira, Entrevista à Revista Ler, Primavera de 1988)

 

Uma parte considerável das narrativas de Milan Kundera parece existir em função das longas digressões sobre questões de índole filosófica ou hermenêutica, em que se cruzam citações próprias e alheias, pela voz de um narrador omnisciente (ainda que, por vezes, homodiegético), que opina constantemente sobre os discursos a que alude. (more…)

Maria Luísa Malato

“A caminho de Cuzco”, foto de Werner Bischof (Andes, perto de Pisac, Vale Sagrado do rio Urubamba, 16 de Maio de 1954)
  • 1. “[…] o que me excita a escrever é o desejo de me esclarecer na posse disto que conto, o desejo de perseguir o alarme que me violentou e ver-me através dele e vê-lo de novo em mim, revelá-lo na própria posse, que é recuperá-lo pela evidência da arte. Escrevo para ser, escrevo para segurar nas minhas mãos inábeis o que fulgurou e morreu” (Ferreira, 1971a: 209-210). Assim escreve Vergílio Ferreira na Aparição. Os estudantes da minha geração que pela primeira vez liam Vergílio Ferreira tinham quinze, dezasseis anos. Vergílio Ferreira era um “autor difícil” porque falava das coisas caladas, as que não lembram ao diabo. Hoje, entre viver a vida, pensá-la e dar-lhe forma, há um silêncio técnico: não cuidamos da arte, nada sabemos da arte de exprimir o que nos vai na alma. Um jovem de quinze, dezasseis anos já não lê por norma Vergílio Ferreira na escola, nem Camus, nem Brandão, nem Altino Tojal, nem Régio, nem Redol… Um adolescente de quinze anos é especialista em solidão. Mas ficou agora sem as palavras que lhe permitem falar dessa solidão. Que lhe permitam transformá-la (quiçá?) em algo admirável pelo próprio: um romance para o português Vergílio Ferreira, uma foto para o suíço Werner Bischof, uma música para um rapaz andino.

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Constança Marcondes Cesar

[Aparição representa a luta pelo equilíbrio, finalmente alcançado,  através da arte e do amor, pelo homem que é atravessado pela  contradição entre a consciência de si, como impulso para um ser mais,  e a consciência da morte. Luta pelo equilíbrio de quem não encontra  mais em nenhum outro absoluto – que não o da consciência de si –  nenhuma possibilidade de transcendência.]

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José Luis Gavilanes Laso

[De un lado, pues, ceñir al hombre a sus límites; por otro, el deseo de trascendencia hacia lo ilimitado. Esta paradoja responde a las dos características esenciales de la condición humana: muerte y deseo de inmortalidad. Es difícil definir al ser humano, pero creo que en esta dicotomía paradójica de Vergílio Ferreira puede estar la clave: el hombre es un ser limitadamente infinito. Los personajes de Vergílio Ferreira se imponen, pues, un desafío crucial: ver hasta qué punto pueden soportar una existencia sin trascendencia y cómo, despojados de un valor absoluto, pueden asumir su precariedad humana. ]

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Rodrigo Michell dos Santos Araujo

[Questão nuclear da obra vergiliana: já no primeiro volume de uma série diarística intitulada Conta-corrente (1993), que o autor mantém desde 1969, encontramos uma necessidade e urgência da escrita para (sobre)viver. Uma escrita desassossegada, uma urgência febril, muitas vezes acometida pela debilidade física: “precisava tanto de escrever, escrever […]. Escrever, escrever, como quem repete o orgasmo até deitar sangue. Desfazer-me em escrita […], repetir-me, esgotar-me rebentar da minha escrita de uma vez” (FERREIRA 1993: 181).]

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Jorge Vicente Valentim

[Depreende-se, por conseguinte, que a escrita ensaística de Vergílio Ferreira mais se autentica como um discurso original, na medida em que se afasta dos padrões científicos e metodológicos tradicionais e em que, no seu conteúdo, procura tratar de alguns dos tópicos mais fulcrais de sua obra, inclusive aqueles abordados pela sua ficção. Se o romance foi o gênero privilegiado para expor a problematização e o exame de alguns temas da existência humana e todas as suas consequentes contingências1, não será improducente pensar que o ensaio foi o espaço consagrado para revelações existentes na sua criação literária.]

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